A catarata pediátrica é a principal causa de cegueira em todo mundo em crianças. O tratamento atual é a retirada cirúrgica do cristalino, com implante de LIO. Porém, ainda não há lente “ideal” que possa substituir a lente natural e, ao mesmo tempo, preservar todas as suas propriedades fisiológicas, sem causar complicações.
Mas e se o cristalino pudesse se regenerar após uma cirurgia de catarata, a partir de células tronco?
É o que pesquisadores chineses, liderados por Yizhi Liu, MD, PhD, da Sun Yat-sen University, estão estudando, juntamente com uma equipe da Universidade da Califórnia, em San Diego. A regeneração do cristalino em mamíferos é dependente de um grupo de células tronco denominados células epiteliais do cristalino (LECs). Estas células têm sido o alvo de várias experiências de regeneração do cristalino.
O cristalino é um órgão que continua crescendo ao longo da vida. Novas fibras cristalinianas vão sendo adicionadas continuamente na periferia da lente, formando conchas de crescimento concêntrico. Em um olho adulto, a cápsula do cristalino possui LECs posicionadas no interior da cápsula anterior. Já a sua parte posterior, está livre de LECs.
Sendo sua origem ectodérmica, o cristalino se regenera em resposta a lesões, mas sua regeneração só é possível na presença de um “meio” apropriado. O alimento fornecido a partir das câmaras aquosas e vítreas serve como um excelente meio para a regeneração. Os ingredientes essenciais para que a regeneração ocorra incluem uma cápsula anterior e posterior intacta, LECs residuais na cápsula equatorial, bem como nenhuma aderência entre cápsulas anterior e posterior. A cápsula precisa estar relativamente intacta.
A pesquisa inicial, publicada em março de 2016 na Nature, envolveu 12 crianças (24 olhos) menores de 2 anos com catarata congênita bilateral. Foi realizado uma capsulorrexis periférica de 1-1,5 mm, e a catarata foi removida usando irrigação/aspiração. Os pacientes receberam atropina e antibiótico/esteróide. Observou-se que abertura da cápsula da lente havia cicatrizado em 1 mês, e aos 6 meses de pós-operatório, uma lente regenerada se formou, apresentando um potencial acomodativo de 2,5 D.
O grupo controle de 25 pacientes (50 olhos) receberam cirurgia de catarata tradicional e apresentaram dados de segurança comparáveis entre os dois grupos.
Lin et al. relataram uma taxa de sucesso de 100%. Nenhuma das lentes regeneradas eram opticamente imperfeitas. Estudos anteriores em mamíferos sugerem que a regeneração é lenta e desorganizada. Houve relatos de massas vacuoladas, opacificação e dobras de tração na lente regenerada em animais. Como a equipe de Lin não encontrou essas surpresas, concluiu-se que há muitos reguladores metabólicos escondidos e agentes inflamatórios responsáveis pelas células epiteliais das lentes que se regeneram nas novas fibras da lente.
A multiplicação das LECs às vezes causam obscurecimento do eixo visual. Neste caso, é a capacidade das fibras regeneradas para se organizar sob a forma de fibras cristalinianas naturais que surpreendeu os pesquisadores.
A regeneração está diretamente relacionada à espessura das camadas corticais deixadas após a cirurgia, especialmente aquelas na região equatorial da cápsula. É preciso deixar alguma matéria cortical residual para ajudar o crescimento, separando fisicamente as cápsulas anterior e posterior.
Agora o desafio é conseguir repetir os resultados na catarata senil, onde a regeneração do cristalino, obviamente, será mais lenta. A aderência das cápsulas pode ser um obstáculo maior nas fibras de lentes adultas que levará mais tempo para regenerar. Nesse sentido, a equipe de pesquisa está trabalhando em uma idéia para acelerar o processo regenerativo usando um “esqueleto” de cristalino biodegradável impresso em 3-D que contém fatores de crescimento para promover a regeneração. Este “esqueleto” seria injetado em um pequeno orifício de forma semelhante a um dispositivo viscoelástico. À medida que as próprias fibras e proteínas da lente do paciente crescem, o “esqueleto” seria biodegradado.
Com o laser de Femtosegundo, também será possível melhorar a técnica cirúrgica, facilitando a realização de uma capsulorhexis pequena e periférica.
Fonte: https://www.nature.com/articles/nature17181#t2